(Jo 15,1-8)
Através da alegoria da videira e os ramos (vv. 1-6) percebemos o pano de fundo desse texto que nos revela quem são os adversários da comunidade joanina: os grupos do sincretismo helenista. Na compreensão desse grupo, a videira é apenas uma variante da árvore da vida. Enquanto que a comunidade joanina afirma que Jesus de Nazaré é a única verdadeira videira capaz de nos oferecer a vida na sua plenitude. Ao escrever seu texto, o autor ambienta, na realidade, sua reflexão na leitura do Gênese que fala da bênção de Jacó (cf. Gn 49,10-12). Nesse texto o autor do Gênese descreve o tempo messiânico com as cores da abundância do fruto da vinha: “Ele amarra seu jumento à videira, à videira generosa o filhote de sua jumenta; lava no vinho sua veste e no sangue da uva seu manto”. Baseando-se nesse ambiente que o profeta Oséias faz, mais tarde, a comparação de Israel a uma vinha, não na perspectiva de esperança, mas de juízo: “Israel era uma videira viçosa e dava fruto abundante. Contudo, quanto mais abundante tornava-se o fruto, tanto mais multiplicava suas idolatrias” (Os 10,1-3). Mas em especial de tudo isso é o canto isaniana da vinha (Cf. Is 5,1-7). O tema de esperança, usando a mesma alegoria de vinha, volta a ser ponto principal reflexão, desta vez, com o salmista (cf. Sl 80). E os sinóticos usam essa imagem profética na parábola dos vinhateiros (os líderes religiosos – e políticos) malignos (cf. Mc 12,1-12; Mt 21,33-46; Lc 20,9-19). É, exatamente, nesse rastro do arado da tradição que o autor joanino se move e desenvolve seu pensamento cristológico.
No pensamento alegórico de João, a videira não é, antes de tudo, o povo messiânico, mas o próprio Cristo (o profeta Isaias descreve a figura de Messias como um “rebento” – cf. Is 11,1ss). A identidade de Jesus de João, apresentado neste texto, é do “Eu sou” exódico (cf. Êx 3,14). A declaração do “Eu sou” e “vós sois” traz, de um lado, a noção de continuidade e, de outro, a ruptura. Jesus é o “povo de Deus” (Israel) no seu estado de madureza. E, ao mesmo tempo, o “novo” Israel, isto é, a encarnação de quanto o povo de Deus esperava para a maturação dos tempos (o povo de messiânico, os cristãos). Essa mesma declaração revela igualmente o tipo de relação recursiva e interdependência entre a videira e os ramos que produzem frutuosos: os ramos ligados à videira produzem frutos, que por sua vez, produzem as novas videiras e novos ramos. Também a relação dialógica: situação de uma relação de complementaridade e antagônicas. E por fim, o apelo de Jesus: “Permanecer em mim e eu permanecerei em vós” revela o tipo de relação hologramática e pericorética: os ramos e seus frutos (os discípulos e suas obras) estão na videira (em Cristo) que está neles. A base dessas relações é o amor recíproco.
Uma outra mensagem desse texto é, ao mesmo tempo, de ação de graças e alerta aos discípulos sobre o perigo da perseguição. Por isso diz: “Se permanecerdes em mim e minhas palavras permanecerem em vós, pedi o que quiserdes e vos será dado. Nisso meu Pai é glorificado: que deis muito fruto e vos torneis meus discípulos” (vv. 7-8); “Quem não permanecer em mim será lançado fora como um ramo e secará. Tais ramos são recolhidos, lançados no fogo e queimados” (v. 6). Assim, para João, os discípulos só terão a salvação e sucesso na vida e missão se permanecerem unidos em Jesus Cristo junto ao Pai, o Agricultor divino. O permanecer não é outra coisa senão o sinal do amor e fidelidade. Esse amor que se imprime no interrelacionamento entre discípulos entre si e com Deus em Cristo Jesus. É na unidade que nos dá força de viver e agir. E a unidade só terá força e resistente na medida em que cada indivíduo é respeitado, valorizado e preservado.
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Lukas Betekeneng
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