(Mc 4,26-34)
É bom lembrar, desde já, que todos os textos bíblicos devem ser lidos, primeiramente, na ótica cultural judaica e semítica e não na ótica greco-romana, antes de fazer qualquer outra interpretação intelectualizada e adaptação cultural, pois se não fosse assim as mensagens originais do texto serão distorcidas e entendidas erroneamente. Depois desse trabalho de compreensão na fonte original que o texto pode ser trazido ao nosso contexto atual (à nossa cultura) em busca da mensagem de Deus para a nossa vida no aqui e agora. Na hermenêutica (ao fazer interpretação) do texto deve prestar muito atenção para não manipular a Palavra de Deus em benefício de qualquer estrutura do poder da autoridade, e, sim, somente para alimentar a vida humana e espiritual de toda a humanidade.
O “reino” de Deus é, antes de tudo, um termo todo político adotado pelos evangelistas como forma de exaltar o domínio do amor de Deus (visão teocêntrica) no mundo criado. É uma maneira de conscientizar os leitores sobre a ação salvífica de Deus na vida do planeta (cf. Sl 16,11; 18,30). Assim, o reino do homem e o “reino” de Deus são colocados lado a lado, com suas características e seus representantes, feito dois caminhos (ou, duas portas) de vida para ser examinado e escolhido (cf. Pr 14,12; Mt 7,13-14). O ser humano tem de usar suas capacidades – dadas por Deus desde o princípio – para tomar suas decisões todos os dias: qual caminho deve ser escolhido e trilhado, em quem deve acreditar, o que fazer e como fazer para poder sobreviver, etc..
O reino de Deus, na concepção da comunidade marqueana, é uma via de mão dupla: ação de Deus e re-ação dos homens. A chave dessa afirmação consiste na afirmação típica de o semeador espalhar suas sementes na terra (no coração do homem) e depois vai dormir e levantar sem saber o desenvolvimento e amadurecimento do plantio (vv.26-27). O termo “não saber” aqui significa a responsabilidade de cuidado do homem. Esse ato de cuidado que será avaliado nos fins dos tempos de vida existencial (v. 29). Ao ser criado à imagem e semelhança do Criador, o ser humano recebe a confiança de Deus do cuidado (v. 28) como cooperador na contínua criação de um mundo cada vez mais humano e mais irmão.
Mas, que tipo do reino de Deus que os evangelistas pretendem passar para os seus ouvintes? É bom saber que a credibilidade da instituição petarnalista está em baixa. A mentalidade patrilinear da convivência precisa ser renovada. O romantismo afetivo no relacionamento masculino-feminino está corrompido. Neste contexto, Jesus exige uma transformação interno, exige uma mudança de mentalidade, renovação de comportamento, exige, sobretudo, a conversão de vida, um voltar à fonte: a paternidade divina e a fraternidade humana. Esse é a concepção do reino da Deus proposto por Jesus de Nazaré, anunciado e testemunhado, com suor e sangue, pelos discípulos e apóstolos (cf. Mc 3,31-35; Mt 23,1-12; Lc 22,32; Jo 15,13-15). Assim, o reino de Deus não é outra coisa senão a justiça social, a paz verdadeira e a alegria profunda, derradeira e duradoura no Espírito Santo (cf. Rm 14,8). O reino de Deus não é posse nem privilégio e nem poder, mas é a condição (o estado) de vida no interior (coração) do homem e que se aflora e frutifique no convívio relacional da humanidade entre si (cf. Lc 17,21), com Deus e com cosmos.
Esse sinal do reino de Deus é muito pequeno feito grão de mostarda (v. 31), mas quando vivido de modo pleno, ele se tornará maior feita a árvore estrondosa capas de atrair, reunir e abrigar todos os viventes do quatro cantos do mundo em baixo de suas sombras (v. 32). Assim é o desejo de Deus, que os homens e mulheres consigam ser, viver e fazer do mundo um lar de irmãos tendo Deus o Pai-maternal e Mãe-paternal e Filial para toda a criação. E essa é o desafio de toda a humanidade, desafio de toda a vida cristã. Esse é o projeto de Deus para a nossa vida, hoje, nesse terceiro milênio.
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Lukas Betekeneng
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