(Mt 28,16-20)
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esde o relato sobre o túmulo vazio, a atenção da comunidade mateana se voltou, agora, para o encontro da comunidade dos discípulos com o Cristo da fé golgótica, na Galileia, sobre o monte[1]. Deve se lembrar que o Evangelho de Mateus é, diferentemente o de Lucas[2], de caráter altamente institucional; e assim, o monte como elemento de destaque, simboliza a estrutura da convivência comunitária na comunidade de Mateus, no sentido de governabilidade. Sobre o monte, Jesus tinha ensinado a nova maneira de ser, de agir e de viver o discipulado (cf. 5,1-2). Agora, de volta no monte para comissionar os discípulos pelo mundo afora cuja missão para pregar a Boa-Nova de Deus (28,19-20), isto é, transmitir todos os ditos e atos de Jesus de Nazaré, crido como o Enviado de Deus na terra. Jesus de Mateus é, portanto, institucional, o Senhor da montanha.
Ao ver o Senhor prostraram-se em ato de respeito e adoração (28,17); contudo, a fé devotiva (o fidelizar) dos discípulos se mistura com o crer[3] duvidoso e incertezas (o credere). Percebe-se que mais que o motivo tradicional da crença imatura e duvidosa dos discípulos perante o fato do Cristo da fé, deve-se ver a situação da espiritualidade da comunidade-Igreja mateana em face de busca de uma melhor compreensão da realidade: que relação existe entre o Jesus de Nazaré (Jesus histórico) e o Cristo do Gólgota (Cristo da fé)? Basta desenvolver a crença no meio das dúvidas e adorar e experimentar a presença do Ressuscitado nos fenômenos carismáticos, ou se requer uma fidelidade total e uma confiança inquebrantável em relação a seu ser pessoa?
Há três grandes temas importantes neste trecho: 1) a autoridade universal de Jesus Cristo concedida pelo Pai (tema cristólogico); 2) a partilha universal da vida de fé do discipulado crístico (tema missiológico). A entrada dos novos membros na comunidade-Igreja será sinalizada pelo ato trinitário do batismo cristão (sacramento inclusivo para todos os membros, diferente do sinal sacramental exclusivo da circuncisão judaica). Assim, Mateus fecha sua obra reafirmando o significado da palavra isaiana do título cristológico do messias anunciado no início do trabalho: Emanuel (Is 7,14), que quer dizer, Deus está conosco (1,23): “Eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos” (28,20); 3) essa promessa da presença permanente presume um “tempo da Ekklesia, ou Igreja (tema eclesiológico) entre a Encarnação do Verbo e a plenificação do Reino de Deus da fraternidade universal, quando Deus se torna tudo em todos (cf. 1Cor, 15,28). A tal fraternidade deve ser vivida já no aqui e agora, e não espera somente para a vida no além. Assim, como diz Karl Rahner, a Igreja já está na meta e rumo à meta.
O alvo público de Mateus é os judeus. Aí que está o desafio. A partir de agora, os discípulos têm de anunciar a Boa-Nova para além fronteiras culturais. E para isso, não bastam a docilidade da vida de fé, a coragem e a boa vontade, é preciso de maturidade, de responsabilidade, de metodologia, de abertura para a inculturação, de respeito das diferenças, etc. Isto significa que a evangelização deve ser feita a partir da cultura do povo evangelizado para que o próprio povo descobre a presença salvífica de Cristo na sua própria realidade social e cultural, e não a do evangelizador, como aconteceu na Igreja durante a sua caminhada histórica.
Concluindo: a Igreja de Cristo é toda missionária. A missão evangelizadora da Igreja é tarefa e a responsabilidade de todos os batizados. Jesus de Nazaré, o Cristo-Irmão misericordioso é o fundamento da Ekklesia. Seus ditos e atos são sinais sacramentais para toda a vida da Igreja. Contudo, o ser humano-imagem-e- semelhança do Criador é o Sacramento dos sacramentos de Deus no mundo. A Igreja, como realidade humana-terrena-cultural, tem seus erros, mas como ter presença permanente do Espírito do Ressuscitado, ela é corrigida e purificada continuamente, cada vez que cai. Por isso ela é santa que tem possibilidade de pecar e, ao mesmo tempo, pecadora redimida e santificada sem cessar. A Igreja de Cristo é edificada no mistério da Trindade, isto é, no Deus comunidade, unidade, relacionalidade e comunicabilidade.
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Por: Lukas Betekeneng
[1] O monte é o símbolo abraâmico do El-Shadai – Senhor da altura (cf. Gn 17,1; 28,3). Monte, na crença de Abraão, simboliza a superioridade, o lugar do Sagrado, o “trioni” da divindade da fé peregrinante de um Abraão: onipotente, onipresente e onisciente.
[2] O Evangelho de Lucas ressalta a importância do equilíbrio social entre os diferentes, para isso a planície é o lugar simbólico de seu evangelho. Jesus de Lucas é, portanto, social, Senhor da planície.
[3] A fé (o fiel e o seu fidelizar) não é a mesma que a crença (o crente e o seu credere ou crer). O crer vem da palavra credere, supõe a maior ou menor incerteza enquanto que a fé – podemos criar um neologismo fidelizar – é a entrega arriscada, a con-fiança absoluta, uma crença inabalável, uma adesão total e sem reserva.
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