domingo, 15 de janeiro de 2012

DESCOBRINDO O CRISTO: Processo vocacional do seguimento de Jesus

(Jo 1,35-420)
A

 vocação é uma ação de mão dupla, isto é, de Deus, como iniciativa primeira, e do ser humano, e é feita desde o seio materno. Deus chama o ser humano a partir de dentro para dentro do cerne do ser. Mas, em algumas situações ela também pode ser pro-voca-da ou despertada pela ação secundária e/ou situação externa. A vocação de Deus é única, mas a resposta dada pelo ser humano é de formas diversas. É de suma importância não confundir a essência da vocação com a profissão. A vocação é o chamamento para “ser”, ao passo que a profissão é o “fazer” técnico, o desenvolvimento técnico do dom e/ou talento específico para manter o bem-estar da existência, própria, do próximo e o dos demais como testemunho de vida e amor-caridade-corresponsabilidade. É nesse campo do testemunho que surge a missão. Por isso pode e deve diferenciar, mas não pode e não deve separar (ou, excluir) o “ser” dos “conviver” e “agir” (com-vocação-co-missão-profissão ou ação), os três sempre estão entrelaçados, ou seja, não dá para falar de um sem os outros dois. Deus nos chama para ser o seu povo, nos enviou para conviver com os outros no espírito de fraternidade solidária e nos capacita de dons e/ou talentos para ser desenvolvido e executado para garantir o bem-estar existencial. A vocação é única, mas as respostas são diversas, as missões são muitas e as profissões são diversificadas, contudo, provem de um e mesmo Espírito (cf. 1Cor 12,4).
O chamamento de Deus não é tão claro como o grito dos homens, é o ruído muito confuso no ouvido, interno e externo, das pessoas por isso requer um acompanhamento personalizado e o discernimento vocacional sério antes de dar qualquer resposta (cf. 1Sm 3,3b-10.19). O primeiro livro de Samuel relata muito bem essa realidade vocacional.
Já falamos anteriormente que a vocação é a voz de Deus que surge de dentro para dentro do interior, contudo, em certas situações essa voz não foi possível ser ouvida nem sentida a sua vibração, por isso precisa ser despertada e/ou provocada. O Evangelho de João (1,35-42) ilustra esse fato de provocação (testemunho) vocacional do discipulado do Nazareno, como testemunho de João Batista: “Eis o cordeiro de Deus” (v. 36) e de André: “Encontramos o Messias” (v.41). Os testemunhos fazem com as pessoas descobrem um “ser ideal” para ser seguido, no nosso caso, o Cristo. Nesse relato, o autor da comunidade-Igreja joanina mostra que Jesus chama os seus discípulos indiretamente. Isto é, através das experiências dos outros, compartilhadas dentro do grupo de convivência e/ou na vida familiar.
A pergunta dos discípulos: “onde moras” – em grego, menein, que quer dizer permanecer (v.38), na cultura da comunidade-Igreja joanina, não é uma simples pergunta sobre o lugar e/ou o lar residencial, é muito mais além do que isso: sobre quem é Jesus de Nazaré, sobre seus sonhos ou projetos de vida, sua razão de ser, sua maneira de conviver e agir. A primeira palavra de Jesus nesse contexto joanino de chamamento vocacional de seguimento é feita em forma de pergunta: “o que estais procurando” (v.38)? Essa pergunta é de suma importância, pois existem seguimentos sem nenhuma motivação clara e profunda, buscas equivocadas e interesseiras. De uma pergunta e outra, Jesus lança seu convite: “vinde e vede” (v.39). Assim, ser discípulo, segundo a concepção de João, é aquele que reconhecer Jesus como Messias enviado de Deus, acolher o testemunho, tomar a atitude de segui-lo no seu caminho, de permanecer com ele, até que se torna a testemunha viva de Cristo (ser alter Christus = outro cristo).
O dinamismo de vida do discipulado, segundo o autor da comunidade-Igreja joanina, sempre gira em torno dos testemunhos, do desejo de conhecer e da atitude de caminhar em busca, de um lado e de outro, as contínuas perguntas examinadoras sobre o objetivo sincero e profundo da procura e do convite para permanecer. Assim, a permanência no caminho vocacional depende muito do testemunho antes e durante – interno e externo, a atitude e/ou desejo de seguir no caminho e do discernimento na busca da experiência. Quem fazer boa experiência e tem bom conhecimento, consegue encarar os desafios dentro e fora (6,68).
Jesus não chamou os seus discípulos diretamente, mas através dos seus ditos e atos, experienciados (ver e conhecer) e testemunhados pelos outros. O testemunho de João Batista sobre Jesus como cordeiro de Deus é cristológico. Isto é, Jesus é a salvação de Deus em operação do mundo. A presença, os atos e ditos de Jesus são vistos como ações que trazem a vida libertada para todos (cf. 10,10). Essa (a vida fraterna, em abundância) é o centro do anúncio evangélico da comunidade-Igreja joanina. O Jesus de João é a vida amorosa e compassiva de Deus doada para resgatar a vida da humanidade-imagem-e-semelhança do Criador. É nessa experiência de permanecer com ele que os discípulos descobriram o Messias prometido, o Cristo-irmão compassivo e misericordioso. O testemunho eficaz do Batista faz com que os dois discípulos dele deixaram a comunidade e seguiram a Jesus no seu caminho (v. 37) e permaneceram com ele. Assim, compreendemos a relatividade da resposta vocacional. Ou seja, responder o chamado é um contínuo processo, uma eterna aprendizagem, uma busca permanente. As formas de vida vocacional não é a meta, é o caminho que pode ser deixado ou mantido depende da experiência do testemunho de vida e do discernimento.
João Batista diz que Jesus é o cordeiro de Deus. Isso significa duas coisas. O primeiro, o jeito de ser e viver de Jesus de Nazaré revela o rosto de Deus da vida para o mundo. É aquele que sempre está disposto a lutar pela vida e liberdade de todos, a ponto de entregar sua própria vida por amor da vida de toda a humanidade (cf. 15, 13). O segundo, o autor quer comunicar para os membros de sua comunidade que o sangue de Jesus é o novo e o último sinal da aliança salvífica de Deus para com o novo Israel. Isso significa que, a Aliança jesuânica, selada com seu próprio sangue supera a aliança mosaica, selada com o sangue do cordeiro sacrifical (cf. Ex 12,7).
Como está indo a nossa vida de testemunho? Muito fácil convidar as pessoas para nos seguir e conhecer, mas não raramente darmos o testemunho adequado para motivar e fortalecer o desejo das pessoas para permanecer conosco. Temos enorme dificuldade de traduzir nossas orações em vida concreta porque os versos de nossos salmos e de nossas preces não são da nossa própria experiência de vida cotidiana. Nossos textos litúrgicos são mais preceitos e definições dogmáticos e doutrinas que são belos, mas muitos secos e vazios, não representam vidas, não tocam a experiência real do cotidiano, por isso não conseguimos concretizar na nossa vida, tanto na própria comunidade eclesial, familiar, quanto na sociedade como um todo.
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BH. 15/01-2012
Lukas Betekeneng

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