Por Lukas Betekeneng
quarta-feira, 30 de novembro de 2011
sábado, 26 de novembro de 2011
CUIDADO! FICAI ATENTOS! VIGIAI!
“Elegância é a arte de não fazer notar, aliada ao cuidado sutil de se deixar distinguir”
(Amborise-Paul-Toussant-Jules Valéry)[1]
1º domingo do Advento
(Is 63,16-17.19; 64,2-7; 1Cor 1,3-9; Mc 13,33-37)
O |
tom do discurso marqueano do Evangelho com essas três palavras de maneira sucessiva, cria em nós uma sensação ou, clima – psicoemocional tanto quanto moral e espiritualmente – meio tenso e apreensivo. Além disso, também nos faz imaginar o quanto a situação do convívio político e social na comunidade-Igreja de Marcos naquele exato momento. Faz-nos, igualmente, imaginar a cena de uma sociedade vigiada, insegura onde as pessoas vivem correndo contra tempo, todo mundo anda com pressa, uma vida de verdadeira corrida onde a rua é de todos, mas cada um por si, ninguém pára para cumprimentar a ninguém, todo mundo desconfia de todo mundo, todo mundo correndo atrás de alguma coisa. A vida está de alerta máxima, de sobreaviso: cuidado! Ficai atentos! Vigiai! Mas por que a razão de o autor insiste tanto na vigia e no cuidado?
A razão da insistência do autor sobre a vigilância, o cuidado e o estar sempre em prontidão é a certeza da incerteza sobre a vinda de Jesus Cristo (vv. 33.35), em uma perspectiva escatológica ou, a parusia. Os termos adotados pelo autor serve, na realidade, como alerta para uma atitude de prudência como forma de se cuidar e preparar a própria vida diante dos desafios, de modo especial o desafio em relação com a salvação da própria existência. É o momento de se cuidar da própria ação convivencial, de se vigiar e sempre atentos aos sinais dos tempos. Cuidar dos pensamentos que se revelam nas palavras; cuidar das palavras que se imprimem nas ações; cuidar das ações que se perpetuam como hábitos; cuidar dos hábitos que formam o caráter; e cuidar, enfim, o caráter que dirige o seu destino final de vida.
Tanto a primeira quanto a segunda leitura e o Evangelho de hoje nos chamam a atenção para a vida de cuidado e de vigilância permanente para não ser surpreendido. Assim, de modo especial nesse tempo de advento, que é o tempo de preparação de vida para a celebração do dia natalício de Jesus Cristo, o Emanuel. Mas, preparar o que e para que? É importante, sim, a preparação do físico-material, mas mais importante ainda é a preparação integral do nosso ser – físico, psicológico, ético e moral social e espiritual – como pessoa humana-imagem-e-semelhança do Criador divino. O Advento é o tempo de re-nova-açao (renovação) do jeito de ser, de conviver e de agir, o tempo de reconciliar, de perdoar e amar, é tempo oportuno de transformação de vida cada vez mais humana e salvífica, é o tempo de voltar ao caminho de Deus da vida (metanoia).
É esse modo de vida vigilante, prudente e de cuidado que nos difere dos demais, é a marca de vida do discipulado crístico. Só o homem e a mulher sábios, afetuosos, maduros, responsáveis e equilibrados que sabem o que significa viver dessa forma. Os cristãos todos são chamados para ficar de sobreaviso, de vigilância permanente, de cuidado contínuo, pois ninguém sabe, nem o dia e nem a hora, da chegada do Senhor (vv. 32-33.35.37). Para Marcos, é óbvio que os discípulos e seguidores de Jesus devem ser missionários atentos dessa Boa Nova de Deus, no aqui e agora, pois o anúncio da vinda do Filho do Homem na sua glória foi lhes confiado. “O que vos digo, digo a todos: vigiai” (v. 37). Há duas intenções da celebração do tempo advental: primeiro, é o tempo de preparação para a celebração da vinda de Deus em forma de um ser humano fragilizado: o Jesus de Nazaré; e o segundo, é a preparação para a segunda vinda do dia do Senhor de cada um e cada uma de nós para nos buscar de volta à casa celeste.
“Que o vosso amor seja sincero e sem hipocrisia, detestando o mal e apegando ao bem” (Rm 12,9). Se o seu amor fica limitado no nível do ouvir da Bíblia, do discurso homilético, da oração programática e do sacrifício ritual, e quando amar se limita aos amigos, parentes e conhecidos, essa prática de amor é pura hipocrisia. Procure fazer o bem para com todos sem discriminação, isto é, para além dos conhecidos: os desvinculados, desconhecidos e os estrangeiros, fazer o bem até para com os inimigos (cf. Lc 6,27). Pois “tudo e qualquer que fizestes a um dos menores de meus irmãos, foi a mim que o fizestes” (cf. Mt 25,40). “Se fazeis o bem aos que vo-lo fazem, que graça alcançais? Pois os pecadores também agem assim” (Lc 6,33). Como estamos vivendo a nossa vida de oração? E como estamos rezando da nossa experiência de vida? Se a vida de oração não fosse vivida concretamente no dia a dia, a própria oração seria uma farsa, um simples balbuciar sem força nem sentido; e se a própria experiência cotidiana de vida não se transforma em frases e versos de oração, a própria vida seria como a flor de plástico que mostra apenas o brilho aparente, no entanto, não oferece nem aroma e nem a vida.
Desejo um Bom Advento para todos! E que a luz do amor de Deus acompanhe cada uma e cada um no seu contínuo esforço de vida vigilante, atenta e prudente, no decorrer de seu preparo até a chegada do dia do Senhor.
_______&&&_______ BH., 25/11-2011
Lukas Betekeneng
[1] Amborise-Paul-Toussant-Jules Valéry ou, conhecido e chamado como Paul Valéry (1871-1945) é um filósofo, escritor e poeta francês da escola simbolista. Suas obras são reconhecidas (em 1917) pela originalidade e pela variedade de temas elaborados, como arquitetura, artes plásticas, músicas e dança entre outras. Mas sua obra mais conhecida popularmente foi quando ele lançou seu poema cujo título “A jovem Parca”, em 1917. Por causa de um amor não correspondido, por Madame Rovira, que fez com que o Paul Valéry se voltou para a reflexão filosófica. Algumas obras filosóficas publicadas em um período de crise foram: “A introdução ao método de Leonardo da Vinci” (1895) e “Monsieur Teste” (1926).
SOB A ÁGUA
(Uma reflexão poética)
Sob a água do céu da minha cabeça, e sob as águas no quarto do meu banho, na cama da minha alma, pingando, fluindo na janela do meu quarto...
Sob a água e sobre o fluxo das águas nascentes, da fonte..., fluindo rumo à foz..., do rio poluído..., fluido calado...,
Sobre o fluxo e os refluxos do fluxo da Água das águas da vida – da Água vem a Vida do vivente..., presente, alegando-se inocente
Do fluxo e os refluxos, perplexo-reflexo, na cama da minha alma, na janela do meu quarto, sob a água e sobre o fluxo das águas na escama do inseto..., exceto na palma da minha mão, o rio poluído, fluído..., calado...
Molhado na minha cama, após o banho do meu quarto, após o sonho do meu sono, após as idéias plebéias, após o café com fé...
Despido sob a água do céu da minha cabeça..., e sob as águas do quarto do meu banho, na cama da minha alma, todo molhado, despido no berço, embalado na manjedoura..., que ninguém adora...
Despido sob a água do céu e sobre as águas do rio..., fluido..., na palma da minha mão, poluído..., calado..., molhando todo o meu corpo..., nu...
Despidos todos – somos – loucos – eu – ELE – você!
_______&&&_______ BH., 25/11-2011
Lukas Betekeneng
quinta-feira, 24 de novembro de 2011
A FIDELIDADE “CREATIVA” E A ESPERANÇA PERSEVERANTE: BASE FORTE PARA UMA VIDA DE FÉ E AMOR RESISTENTE
(Lc 21, 12-19)
“Quando se ama, a fidelidade não custa nada”
P |
(Henry de Montherlant)[1]
ercebe-se que o discurso lucano do evangelho dirigido aos cristãos de sua comunidade-Igreja remonta, na realidade, ao fato do Jesus de Nazaré, o Cristo-irmãos misericordioso da fé, todavia, foi influenciado pela própria experiência cristã recém-nascida do testemunho de queda de Jesrusalém (vista e interpretada como julgamento divino por causa de sua infidelidade ao amor de Deus, seu descuido e sua imprudência) e da perseguição sistemática e popular dos primeiros mártires, como: Estêvão, Pedro, João, Tiago e Paulo, e muitos outros. Essa real experiência de vida serve, portanto, como exemplo e estímulo para todos os discípulos e seguidores: a coragem no testemunho da verdade de fé, a humildade e prudência no convívio interrelacional com os diferentes, a fidelidade ao amor incondicional de Deus anunciado e testemunhado por Jesus Cristo, a firmeza na esperança viva e ativa da graça protetora e salvadora e a confiança plena no Espírito salvífico do Pai celeste.
Entre todos os autores do Evanglho, Lucas é um evangelista diferenciado ao escrever sua Boa-Nova de Deus, em Cristo, estruturando em três tempos: o tempo profético da promessa esperançosa; o tempo crístico da revelação e realização efetiva da promessa messiânica; e, porfim, o tempo eclesiológico da mundialização do testemunho do amor fraterno. Em todos esses três tempos de economia da salvação divina, foram e serão sempre marcados pela perseguição e martírio, aqui e acolá, de uma e/ou de outra forma. Essas realidades desafiadoras são o preço do amor pela verdade de vida e seu sentido e que também já foi e será sempre pago pela outra vida para, mais tarde, poder reté-la de volta, no momento de sua plenitude (9,24), por essa confiança, diz: “É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida” (v. 19).
A própria presença de Jesus serva como luz reveladora que clareia o passado improdutivo, defasado e caduco e aponta para um caminho novo transformador do futuro a ser seguido. Ou seja, a presença reveladora de Jesus já é o próprio tempo de regeneração, de pro-vocar-ação (provocação), de refundação ou, de refontização, de redirecionamento, de re-nova-açao (renovação), é o tempo de crise e de crascimento, de auto-re-parturição de vida (cf. Jo 3,3), de aprender a reaprender a conviver e amar e ser fiel com o entusiasmo de uma criança (cf. Mt 18,3).
O tom assombroso do discurso do autor não é, contudo, para amedrontar o entusiasmo dos fiéis no seu testemunho, mas também não para hesitar o seu espírito de chicoteamento moral/espiritual e psicoenocional em nome do amor pela verdade nem para ascender a chama do ânimo descontrolado. Muito pelo contrário, serva de alerta ou prevenção – baseada na própria experiência – para ter mais consciência da realidade e a prudência na hora de agir, ter mais coragem e, ao mesmo tempo, humildade, mais fidelidade e firmeza, mais confiança, amor e esperança. Os discípulos e seguidores de Jesus, por causa dessa realidade, não podem ficar nem temeroso, nem ansioso e nem frenético sobre as perseguições que vão se encontrar pela frente. Todos eles, claro, terão oportunidade de dar seu testemunho (cf. At 3,15; 4,20). Contudo, não precisam preocupar em nada nem mesmo com o que irão dizer no momento do julgamento, pois, garante o autor, o próprio Espírito do Ressuscitado vai atuar com eficiência e eficácia no momento certo e na hora certa, de tal modo que nenhum de seu adversário poderá resistir ou rebater (v. 14).
Tudo isso, segundo o autor, é para demonstrar o tamanho de seu amor por um “nome”. O nome desse que eles têm acolhido, crido e depositado sua confiança e esperança: o Jesus de Nazaré, o Emanuel que se tornou o Cristo-irmão misericordioso. O nome, para nós no Ocidente, não diz quase nada, mas para o Oriente, ter um “nome” significa a síntese do “ser” alguém na vida e na missão. Meu nome é minha missão. O nome é a porta de entrada do ser. Tudo o que vivo e faço externamente tem a ver com aquele que sou internamente. Assim, quando mudar de nome de alguém significa mudança de sua missão. Para o autor, os discípulos e seguidores têm de mostrar seu amor per esse “nome” apostando tudo o possível. Porém, não devemos esquecer que a fidelidade serena e a confiabilidade plena só existem realmente para quem ama verdadeiramente. Mas, em que, afinal, consiste esse amor eternal por causa da importância desse “nome” que se exprime na fidelidade e confiabilidade?
Amar sempre é um arriscar-se consciente, corajoso, confiante e “creativo” de sua própria vida e felicidade, apostando nos dias melhores. O amor é a força mística de vida que sempre está em busca de união comunial com outra vida, que não é outra coisa senão a própria vida de Deus em nós. Quem ama de verdade, sempre disposto a se “desaparecer” no outro ou na outra por amor, com amor e no amor. Assim, o Deus, por causa de tanto amor por nós, se entregou totalmente através da fusão de seu Espírito desde o princípio da criação do nosso ser existencial. Mas, de tal perfeita essa entrega que faz com que se desapareceu por completo em nós para nos dar a vida. Como se isso ainda não bastasse, tomou uma atitude ainda mais radical para demonstrar seu amor sem limites, se tornou um de nós, assumindo totalmente a nossa natureza humana, se acampou no meio de nós e se entregou na dor e experimentou a morte na lenha da cruz por nossa causa, entrou no seio da terra para nos tirar da boca do túmulo de nosso próprio egoísmo e egocentrismo.
O amor eternal consiste, portanto, na disposição espontânea de aceitação do outro como outro inigualável, de tão profundamente desigual que nos torna, por isso, ainda mais radicalmente semelhante, e por isso mesmo esse outro ou essa outra é importante para o meu “eu”; consiste também no espírito de tolerância e de mútuo respeito pelas diversidades, em todos os sentidos e níveis, diversidades essas que são tidas e cridas como riqueza incomparável, como fonte inesgotável e graça derradeira que Deus tem concedido para a nossa felicidade.
A consolação psicoemocional e moral/espiritual contida nas duas frases finais sobre a realidade do fim: “Vós não perdereis um só fio de cabelo da cabeça. É permanecendo firmas que ireis ganhar a vida” (vv. 18-19), não é uma visão triunfalista, mas é um convite claro à atenção e à reflexão no hoje de vida.
Como estamos vivendo a nossa fidelidade? Estamos tendo creatividade para superar a nossa dificuldade ou simplesmente deixamos como era e continuamos o nosso ritmo de sempre como se não tivesse nada? E a nossa esperança, está acompanhada do espírito de perseverança operante ou de sempre repetente? É necessário derrubar o medo e abandonar o tradicionalismo e narcisismo de vida adâmica para implantar o novo modo de ser, viver e agir como homem novo na sua maturidade em Cristo Jesus.
______&&&______ BH., 23/11-2011
Lukas Betekeneng
segunda-feira, 21 de novembro de 2011
A FÉ AMPLIA TRANSFORMANDO A RELAÇÃO DE PARENTESCO EM COMUNIDADE DE IRMÃOS EM DEUS
(Mt 12,46-50)
D |
iante dos desafios que a comunidade-Igreja recém-criada enfrenta no começo de sua vida, a pergunta que está na cabeça de todo o mundo seria essa: o que é que nos difere com os outros povos e crenças? Ou seja, qual é a marca típica de nossa identidade como seguidores e seguidoras de Jesus de Nazaré, o Cristo-irmão misericordioso? Como aconteceu na comunidade marqueana e lucana, assim também na comunidade mateana do Evangelho: a busca constante de identidade própria de vida do discipulado crístico. A busca do novo jeito de ser, de viver e de agir.
Como maior desafio da comunidade-Igreja de Mateus é o conservadorismo e/ou tradicionalismo judaico dentro da própria comunidade-Igreja, o movimento cristão precisa de uma identidade clara, de uma espiritualidade própria e de uma compreensão diferente de ser, de viver e agir como homem e mulher de fé. Precisa de uma luz clarificadora do interior capaz de identificar uns e outros e unificar o grupo em torno de um objetivo comum: procurar ser, viver e agir de acordo com a vontade de Deus que está no céu através da escuta de sua Palavra-Vida e a põe em prática salvífica, para consigo e com o próximo (v. 50; Mc 3,35; Lc 8,21). É esse objetivo comum que serve como vínculo que estabelece o inter-relacionamento lógico ou de interdependência afetiva-efetiva entre os membros.
Por desconhecimento (ou, até por causa de parcialidade e/ou precariedade das informações) cultural do povo oriental em geral e do Médio Oriente em particular e mais especificamente da cultura semítica que faz com que alguns chegaram a afirmar – e ainda continuam afirmando – de modo equivocadamente que Jesus tem rompido seu vínculo com sua família sanguínea para viver isoladamente com seu grupo reduzindo, dessa forma, em uma simples coexistência. Essa interpretação, no meu modo de ver é muito sintomática, interesseira e manipuladora e, portanto, insalubre para a vida mística e espiritualidade cristã. Mesmo porque a compreensão de família e de familiaridade cultural oriental é bem diferente do Ocidente. A formação de uma família, na cultura oriental, se baseia em uma concepção da aliança sagrada, profunda e indissolúvel, indivisível e inviolável, pois é o centro gerador e formador e transformador da vida, e não de uma concepção de contrato. E a familiaridade vista e crida como fruto dessa graça da aliança estabelecida que restabeleça um novo vínculo interno ampliado, e que ultrapassa a concepção sanguínea de familiaridade. Assim, torna uma pequena família em “Grande Família”.
Jesus tem se distanciado de sua família natural para se dedicar à missão salvífica e libertadora de Deus, e esse distanciamento é a consequência, mas nunca a abandou no sentido de rompimento do seu vínculo familiar. Se fosse, seria mais uma especulação do intelecto racionalizado que a racionalidade do real sentido da experiência vivida.
O evangelista – assim como Marcos e Lucas – mostrou o seu Jesus tentando superar a tradicional compreensão judaica de irmão (ou, de família e familiaridade). Antes, a compreensão de irmão gira em torno de cinco possibilidades: irmão de sangue (do mesmo pai e da mesma mãe), irmão pelo parentesco tribal, pela circuncisão, pela localidade residencial e, por fim, pela descendência abraâmica. Jesus supera, por sua vez, a compreensão de irmão pela fé em um e único Deus que está no céu como Pai de toda a humanidade e todos somos irmãos e irmãs.
Para Jesus, agora é o momento de sair da toca aprisionadora para se lançar no horizonte de vida fazendo todos e todas a irmã e o irmão no mesmo e único amor misericordioso do Pai celeste, “concidadão dos santos e membros da família de Deus” (Ef 2,19). E a identidade dessa nova “Grande Família” é a fidelidade operante da vontade de Deus: “Quem quer que faça a vontade do meu Pai celeste este é meu irmão, minha irmã, minha mãe” (v. 50). Essa é a marca de vida dos discípulos e seguidores de cristo: escutar atentamente a Palavra de Deus, buscar sem cessar a sua vontade e põe em prática com criatividade na fidelidade (cf. Lc 8,21). Os cristãos, segundo o evangelista, são os procuradores e fazedores da vontade de Deus. As congregações religiosas na Igreja, hoje, são tentativas da realização desse projeto crístico de “Grande Família” de fraternidade e irmandade (ou, de familiaridade) baseada na fé. Como estamos vivendo a nossa “Grande Família” de fé? Em outras palavras, para onde está indo e onde quer chegar a nossa “Grande Família” de fé, eclesial e congregacional?
________&&&_______ BH., 21/11-2011
Lukas Betekeneng
domingo, 20 de novembro de 2011
DO JESUS HISTÓRICO E CRISTO DA FÉ AO REI DO UNIVERSO
(Mt 25,31-46)
A |
Igreja encerra, neste domingo, o seu ano litúrgico com a celebração solene de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do universo. Com essa festa abre, então, o tempo de Advento (que neste ano começa no dia 27 de novembro), que é a preparação para a solenidade do nascimento de Jesus, o Natal. Mas o que quer dizer, Jesus Cristo Rei do universo? Será que Jesus foi, de fato, um rei em algum lugar na Palestina ou em outros territórios próximos do Oriente Médio? De onde vem essa ideia de Jesus rei? Há mensagem evangélica que menciona Jesus como rei? Tem fundamento teológico a respeito desse título? Quando começou a instituição, historicamente, dessa celebração de Cristo como Rei?
Um pouquinho de memória.
A celebração de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do universo foi anunciada e instituída pelo Papa Pio XI no ano 1922 e promulgada através da Encíclica papal Quas Primas, a 11 de dezembro de 1925, na ocasião de comemoração aos 16º centenário de proclamação conciliar do dogma da Consubstancialidade de Jesus Cristo ao Pai, verdade legada pelo I Concílio de Nicéia – da Bitínia, atual Iznik da Turquia (20 de maio a 25 de julho de 325). A instituição da festa Cristo Rei do universo pelo Papa Pio XI foi em um contexto de cristandade europeia, exatamente na época em que o mundo político passava pela situação pós-guerra mundial, a primeira (1914-1918)[1]. A situação do mundo pós-guerra marcado pelo fascismo italiano, nazismo alemão comunismo russo, marxismo-ateu, pela dificuldade econômica que atinge a Europa, fruto desse conflito bélico, pelos governos ditatoriais que solapavam toda Europa, pela perseguição religiosa de maneira popular e sistemática, pelo liberalismo e outros mais que empurravam o mundo e o povo a distanciar-se da religião e de Deus. Toda essa realidade contribuiu, sem dúvida, para a explosão da segunda Grande Guerra (1939-1945)[2].
A intenção do Papa era para conscientizar ou mesmo para despertar nos corações desses governos ditatoriais sobre o sentido e valor da vida humana, isto é, para que todas as coisas culminassem na plenitude em Jesus de Nazaré, o Cristo e Senhor da vida que venceu a morte pela entrega da sua própria vida, conforme anuncia o João: “Eu sou o Alfa e o Ômega, Aquele que é, Aquele que era e Aquele que vem, o Todo Poderoso” (Ap 1,8). Mesmo usando justificava bíblica, o anúncio é de cunho político e não teológico. O próprio Jesus superou esse apego do poder e proporcionou um novo modo de ser e viver dos cristãos: e fraternidade crística (cf. Mt 23,8). Esse é o terceiro e último patamar da experiência da vida de fé e amor que Jesus tem feito para com seus discípulos e seguidores, para todos os cristãos, para com toda a humanidade que crê em Deus da vida. Esse é o caminho, a verdade e a vida a ser seguido. Mas o problema é que a própria Igreja se apega ao poder, consagra o poder e apodera o poder exibindo de modo simbolicamente através das vestimentas, das construções como torres, igrejas ou catedrais, e muitos outros edifícios suntuosos. A própria leitura do evangelho, se fosse lida e contemplada criticamente sua mensagem, não corresponde com a festa de Cristo rei, aliás, não existe Evangelho correspondente a essa festa.
Realidade bíblica do AT
O atributo “rei” dado a Jesus de Nazaré e Cristo-irmão misericordioso da fé é mais político do que teológico. É uma idéia de “teologia do poder” desenvolvida na Igreja. Essa ideia tem sua raiz na “teologia da Aliança” que a teologia política do Antigo Testamento, uma vez que o povo judeu distingue entre a política e religião, porém, não separa excluindo-as como nós fazemos no Ocidente. O sonho hebreu de rei e reinado embrionariamente já começo desde que o povo fugiu do Egito liderado pelo Moisés. Esse sonho real de Israel se realizou esplendidamente, no nível sociopolítico/cultural tanto quanto econômico e religioso no reinado davídico[3] (cf. 2Sm 7). Esse fato pode ser percebido em alguns dos salmos reais, destinado especialmente em homenagem ao sucesso do rei Davi (cf. Sl 2; 20; 21; 72; 89; 101; 110).
O termo teológico equivalente da palavra rei seria messias (do hbr. mashyach = o ungido), e que foi traduzido em grego khristos e em latim christus e, enfim, em nosso bom português, cristo que significa o libertador. Em alguns textos bíblicos, o termo messianismo tem significado incerto, por exemplo, em Hab 3,13 é destinado a nação e o Salmo 105,15 e 1Cr 16,22, para os patriarcas e profetas. Com a decadência do reino davídico (após a sua morte) e Israel como presa fácil nas mãos dos poderes estrangeiros, o sonho de um messias ganhou força cada vez mais, até o nascimento de Jesus.
Novo Testamento
Jesus nunca foi nem príncipe nem rei em lugar nenhum. E nem ele próprio aceitou esse poderoso título de nobreza real (cf. Mt 27,11). O que ele declarou foi como irmão e amigo para com seus discípulos e seguidores (cf Mt 23,8; Jo 15,15). Na linguagem dos evangelistas, o termo rei tem outra conotação, isto é, usado como ironia aos reis colonizadores que praticavam todo o tipo de crimes e violências cruéis – político, econômico, social e cultural/religioso – contra o povo da terra. No meio dessas práticas desumanas que faz com que alguns grupos judeus queriam que Jesus fosse entronizado como rei dos judeus. A coroa de espinho colocada na cabeça de Jesus revela duas coisas: de um lado, o desprezo pelo poder e, de outro, sinal de simplicidade serviçal e da fraternidade misericordiosa. A coroa de metal colocada na cabeça de Jesus no trono para mostrar que ele é rei, no meu ver, foi uma caricatura muito ridícula, horrorosa e de desrespeito, pois não corresponde com a realidade.
Aprofundado o nosso texto
O texto dramatiza uma cena de julgamento final no céu, porém com característica típica de um tribunal de pena comum nos governos terrenos. Nesse julgamento, o juiz é apresentado com título apocalíptico do Filho do Homem do profeta Daniel (cf Dn 7,13-14). O julgamento é de caráter universal, isto é, para toda a humanidade de todas as gerações e religiões e crenças no planeta Terra.
No processo de julgamento, o rei-juiz começa a ler um texto de argumentos (ou, de acusação) como razão tanto para os que serão condenados quanto para os que serão premiados. Antes, o rei-juiz separa a humanidade em dois grupos, do bom do lado direito e do menos bom do lado esquerdo. A acusação é o mesmo para ambos os grupos e tem seis itens, contudo, se difere no fazer e não-fazer durante a sua vida terrena. Na leitura do texto de acusação o rei-juiz usou a primeira pessoa “eu” e que provocou os questionamentos dos dois grupos. E a resposta foi mais simples ainda.
A primeira leitura foi dos motivos de premiação do grupo do lado direito, dizendo: “vinde benditos do meu Pai! Recebei como herança o reino que meu Pai vos preparou desde a criação do mundo!” Aí, segue os motivos: “Pois, eu estava com fome e me destes de comer; com sede e me destes de beber; estrangeiro e me recebestes em casa; estava nu e me vestistes; eu estava doente e cuidastes de mim; eu estava na prisão e fostes me visitar” (vv. 35-36). Enquanto para o grupo do lado esquerdo se diz: “Afastai-vos de mim, malditos! Ide para o fogo eterno, preparado para o diabo e para os seus anjos”. Aí, segue os motivos: “Pois eu estava com fome e não me destes de comer; com sede e não me destes de beber; estrangeiro e não me recebestes em casa; eu estava nu e não me vestistes; estava doente e na prisão e não fostes me visitar” (vv. 42-43).
Cada grupo tem momento de réplica, em forma de pergunta, após a leitura e tréplica como resposta do rei-juiz. Os dois grupos fizeram o mesmo questionamento dizendo que nunca tinham visto o rei-juiz nessas situações. Se tivessem o visto em algum lugar nessas realidades o teriam feito, certamente, alguma coisa conforme a necessidade (vv. 37-39. 44). O questionamento do primeiro grupo foi de caráter confirmativa pelo prêmio recebido e o do segundo foi de cunho defensivo em vista de anulação da condenação. A resposta do rei-juiz foi de modo enfático, dizendo que: “Todas as vezes que fizestes ou não a um dos menores de meus irmãos, foi a mim que o fizestes” (vv. 40. 45). A resposta reafirma a unidade indivisível entre a humanidade e divindade, entre Criador e criatura: “Eu e meu Pai somos um” (cf. Jo 10,39).
Na realidade todas essas coisas – o fazer e/ou o não fazer o bem criativo para com o próximo durante a vida terrena – são formas de vida de vigilância operante e responsável durante o tempo de espera da vinda do dia do Senhor. É o sinal de maturidade e fidelidade criativa e responsável do homem e mulher de fé madura e equilibrada.
Todas essas práticas são modos de fazer transparecer o luminoso rosto de Deus amoroso, compassivo e misericordioso para com o próximo. Essa é a nossa missão como sua imagem e semelhança e filhos no Filho. Fazer o bem ao próximo é a uma das conseqüências do seguimento de Jesus Cristo que “andava por toda parte fazendo o bem para com todos sem exclusão” (cf. At 10,38) a ponto de entregar sua própria vida por amor pela vida de toda a humanidade (Jo. 15,13) que ele mesmo declarou como seu irmão e irmã e amigo e amiga do mesmo Pai que está no Céu, e nos pede para que nós possamos fazer o mesmo como ele nos fez (cf. Jo 15,12-13). É o amor a Deus e pelo próximo que nos justifica e premia e/ou julga e condena.
Esse imaginário de tribunal de julgamento final é uma metodologia típica oriental e semítica usada pelo autor para chamar a atenção e conscientizar os cristãos para viverem comprometidamente sua vida cristã com a realidade social e política da sociedade. Uma vez que a Igreja não está fora do mundo, mas no mundo, e a esse mundo que ele foi chamada e enviada para ser instrumento de salvação: ser sal para condimentar a putrefação ética e moral, e ser fermento para levedar o amor.
Seja mais solidário, caridoso, compassivo e misericordioso para com todos. Procure amar a Deus nos próximos e em toda a criatura e amar o próximo em Deus sem discriminação e exclusão. Que a sua caridade seja serena e justa, construtiva e libertadora. Procure fazer o bem, não para receber a gratificação nem para comprar a alguém para a sua Igreja, mas por puro ato de amor pela pessoa como tal.
________&&&________ BH., 20/11-2011
Lukas Betekeneng
[1] A primeira guerra mundial – também conhecida como Grande Guerra – foi um choque bélico mundial que se iniciou na Europa, ocorrido entre 28 de julho de 1914 a 11 de novembro de 1918. O conflito ocorreu entre a Tríplice Entente (liderado pelo Império Britânico, França e Império Russo) até 1917 e os Estados Unidos (a partir de 1917) que derrotou as potências centrais, que também, um outro Tríplice Entente (formado pelo Império Alemão, Império Austro-Húngaro e Império Turco-Otomano) o conflito provocou uma mudança radical do mapa geo-político da Europa e do Médio Oriente.
[2] Como na primeira Grande Guerra, a segunda também se iniciou na Europa e se espalhou rapidamente pela África e Ásia. O motivo dessa guerra como já foi mencionado anteriormente: o espírito expansionista dos governos fascistas da Itália, Alemanha e do Japão que formaram, chamada Potência Central (ou, conhecido também como eixo Alemanha, Itália, Japão). A guerra terminou com uma ação política e militarmente vergonhosa, desnecessária e desumana dos Estados Unidos jogando bomba atômica sobre cidades japonesas de Nagazaki e Hiroshima, matando milhares e milhares dos civis inocentes.
[3] Segundo o arqueólogo americano, Edwin Thiele, o rei Davi nasceu por volta do ano 1040 a.C e faleceu por volta do ano 970 a.C. Conforme a Bíblia hebraica, Davi foi o segundo monarca do reino unificado, Israel e Judéia (1003 a.C -970 a.C).
sexta-feira, 18 de novembro de 2011
DO “CREDERE” AO FIDELIZAR
(Mt 14,22-33)
D |
e todos os que relataram a cena de aparição de Jesus caminhando sobre as águas (cf. Mc 6,45-52; Jo 6,16-21), somente Mateus que mencionou o nome de Pedro, apelidado como homem de muita crença em Jesus de Nazaré, mas de fidelidade fraca ao Cristo da fé, pois se deixa dominado pelo medo e pela incerteza (vv. 30-31). Além de Pedro, há também no barco os discípulos e os outros. Com essa menção do autor nos faz entender que o relato é carregado de simbolismo: a pessoa de Pedro, o barco, o vento e o caminhar de Jesus sobre as águas. O texto conclui com uma declaração de fé coletiva (sensus fidelium = sentido da fé coletiva ou, intuição cheia de graça divina) do grupo que estão no barco da vida: “Verdadeiramente, tu és o Filho de Deus” (v.33).
O barco representa a própria comunidade cristã mateana tendo Pedro como seu líder; nessa comunidade estão reunidos os discípulos e os seguidores ou, talvez os novos membros que acabaram de ingressar na comunidade-Igreja recém-nascida. O vento, na bíblia representa a presença do Espírito dinamizador; porém nesse caso o vento é símbolo de forças desafiadoras, talvez quisesse dizer sobre a situação que a comunidade-Igreja está vivendo naquele momento. O desafio era tanto que metia o medo e abalava a fé de toda a comunidade, começando com a fé e confiança do próprio líder. A comunidade é completamente dominada pelo temor e incertezas, tudo está escuro, parecia sem saída. Para poder superar o desafio e salvar a comunidade dessa turbulência, o líder precisa reter coragem e tomar a atitude mais rápida,rezando pedindo o socorro ao Senhor para conduzir o barco da vida atravessar a agitação das ondas do desafio para o outro lado, dizendo: como Moisés conduziu seu povo atravessando o mar vermelho, da mesma forma pedimos que “Senhor, se és tu, mande-me ir ao teu encontro” (v.28). Jesus é o novo Moisés da nova Aliança. Moisés era o servo fiel do Senhor-Adonai, por isso precisava de ajuda de YHWH na travessia do mar vermelho, mas Jesus é o Filho amado e que tem poder sobre as forças da natureza. O caminhar sobre as águas representa esse poder que Jesus tem sobre as forças do mundo.
A mensagem que o autor quer nos passar é clara: a importância da fé do indivíduo como elemento nuclear da edificação da vida de fé comunitária e que faz com que todos, finalmente, em uma só voz clama: “verdadeiramente, tu é o Filho de Deus”. É uma proclamação de fé eclesiológia e soteriológica em Jesus Cristo como Senhor e Salvador da humanidade. No meio do desafio é precisa de muita fé e unidade. Não basta crer, é precisa de amadurecimento na fé e ser fiel. A crença somente nos afunda, mas a fé profunda nos faz ressurgir e nos salva de qualquer tempestade de vida. É de suma importância fazer passar do crer (ser crente) ao fidelizar (ser fiel). Pois a crença é a fé duvidosa, imatura e incerta, mas o fiel é a vida de fé amadurecida e aprovada pela real experiência de vida, por isso mesmo, ela é seguro, firme, resistente.
A quem recorremos quando nossa vida passava pelas turbulências? Cremos em Jesus somente ou devemos crescer e amadurecer na fé nele? O que fazemos quando nossa comunidade vive a mesma situação, mobilizamos a comunidade para juntos superar o desafio ou ficamos com medo e deixa cada um se vira? Um líder medroso, imaturo, sem criatividade e duvidoso só levar a comunidade a arruinar e, por fim, afundando aos poucos. Liderar é saber lidar com as diferenças, com os desafios, saber co-ordenar e não mandar de cima, mas saber dialogar com todos para procurar as saídas prováveis.
_______&&&_______ BH., 18/11-2011
Lukas Betekeneng
DO EDIFÍCIO MATERIAL AO EDIFÍCIO ESPIRITUAL
(Lc 19,45-48)
J |
erusalém é a meta final da jornada de Jesus lucano desde a Gelileia, mas o templo é o objetivo principal de sua entrada na cidade. No templo que ele foi apresentado pelos pais, reencontrado mais tarde no meio do povo dialogando com os presentes, trocando as sabedorias e os conhecimentos com as pessoas, foi reconhecido e admirado por todos (cf. 2,22-33; 2,41-50). No templo (sinagoga) também que ele se reuniu com os discípulos, seguidores e multidões para orar e adorar a Deus, para escutar a Palavra-Vida e partilhar a reflexão, para anunciar a atuação do Espírito do ABBA-Pai na sua programação missionária da salvação-libertação no mundo (cf. 4,18), por causa de declaração de amor pelo templo como casa de oração e adoração e de ser filho de Deus ele foi preso, julgado e condenado à morte, e morte na lenha da cruz (cf. 22,66-71; Mc 11,15-19; Mt 21,12ss; Jo 2,13ss; Sl 69,10). E no templo que os discípulos se reuniram para rezar e anunciar a Boa-Nova (cf. 24,53; At 2,46; 3,1ss; 5,12).
O templo cuja função como espaço do encontro entre o ser humano entre si e com Deus, como escola de oração, de adoração e de formação de vida mística e espiritual, o símbolo da justa unidade indivisível, tanto na dimensão vertical quanto horizontal, como exteriorização da realidade de vida interior onde reside o Espírito do Criador divino, foi usado como lugar onde se pratica a injustiça e a impunidade ou, covil de ladrões e a divisão dos povos. Por isso, a entrada no templo, segundo autor da comunidade lucana do Evangelho, é visto como ato de tomada de posse para purificá-lo e, enfim, devolver a sua função original como casa de oração (v. 46). No templo, o evangelista não fala da reação dura de Jesus quando encontrou com a realidade da função do templo como lugar de comércio, mas apresenta um novo elemento: Jesus está no meio do povo, todo o dia, para ensiná-lo.
Assim, o povo (o coração do povo) de Deus é, a partir de agora, o novo espaço de encontro entre o ser humano consigo e entre si e com Deus, o novo lugar de oração e adoração (cf. Mt 6,6). O ser humano como imagem e semelhança de Deus é, em Cristo, confirmado como templo do Espírito Santo criador (cf. 1Cor 6,19), substituindo, dessa maneira, o templo de Jerusalém. O movimento de Jesus supera a crença institucionalizada da religião, enquanto sistema, fazendo passar para a fé religiosa que é a parte de natureza humana divinizada e divina humanizada. O povo é, agora, tem liberdade de se aproximar a Deus, como na palavra de Leonardo Boff, o Pai-maternal e Mãe-paternal e filial.
Como que estamos vivendo a nossa fé? Estamos cuidando o nosso coração como lugar de oração e adoração ou espaço comercial onde se pratica todo o tipo de maldade: a injustiça, a negação do direito e da liberdade, a exclusão das diferenças para manter o status quo, o afastamento do indivíduo comunitário em benefício do individualismo institucionalizado (a prática do poder pelo poder usando e abusando camufladamente atrás da bandeira do serviço). Como estamos tratando o nosso coração, usando-o como lugar onde reside o Espírito da vida ou como quarto onde se planeja a morte, como lugar do bendizer ou de fofoca, de ódio, de desgosto, e de discriminação? Não raramente usamos o nosso coração para a prática do mal em nome de Deus, da religião, da instituição e da lei. É uma verdadeira hipocrisia que devemos repensar, assim, para fazer a religião cada vez mais humana e divina, ao mesmo tempo, mais justo e digno de ser crida e vivida. Tudo isso e, muito mais, é o desafio real para todos aqueles que se chamam de cristãos.
______&&&______ BH., 18/11-2011
Lukas Betekeneng
quarta-feira, 16 de novembro de 2011
terça-feira, 15 de novembro de 2011
O MEDO APRISIONA E MATA! O AMOR LIBERTA E DAR A VIDA!
(2Mc 7,1.20-31; Lc 19,11-28)
A |
“O medo conduz à morte, a coragem às estrelas”
(Séneca)[1]
fidelidade creativa é o sinal de amor maduro, equilibrado, libertador e salvador. Quem ama cuida! Quem ama verdadeira e profundamente não tem medo de ser creativo e inventivo, não tem medo de fazer o novo acontecer. O medo aprisiona a coragem, corrói a confiança e mata as potencialidades, os talentos. Mas, ter coragem também não significa absolutamente a ausência do medo, muito pelo contrário, a superação dele, a resistência do medo. A coragem é a potência da fé, a energia do desejo de viver, crescer e amadurecer e que toma forma de disposição para inventar e reinventar encarando o desafio com confiança e esperança dos dias melhores.
A fé madura supera até o medo da dor e da morte (cf. 2Mc 7,1.20-31). Nesse texto de Macabeus, o autor relata a força da fé de uma mulher testemunhando a morte de seus filhos. A mulher foi obrigada para convencer seus filhos a abandonar sua fé, mas tudo foi em vão, pois todos preferem entregar a vida na boca da morte do que negar a sua própria experiência de Deus como aquele que já se demonstrou ao longo da história, a fidelidade e a segurança. A fé não é algo que se transfere, mas se adquire através da partilha, do testemunho. A crença pode ser abandonada, mas não com a fé.
Lucas desenvolve seu texto-parábola dos talentos enriquecendo os elementos paralelos de Mateus (cf. Mt 25,14-30) e adaptando-os ao seu ambiente cultural. Tanto Lucas quanto Mateus têm o mesmo objetivo: criticar a improdutividade da vida de fé, fruto de experiência negativa do Iahwe como um Senhor severo que mete o medo (v. 21), um Deus vingativo e condenatório. Contudo, se diferem no seu protagonista principal. Jesus de Mateus é associado a um rico comerciante que viajou ao país distante ao passo que o de Lucas, a um nobre, que parte para receber a investidura régia. Esse acréscimo do coroamento é a maneira própria de Lucas quer atender a expectativa popular do Reinado de Deus (v. 11)[2]. O vestígio desse relato se encontra também em Marcos (cf. Mc 13,34).
O medo é o extremo da ignorância, o sinal da infidelidade afetiva e fraterna no convívio relacional, a infertilidade da vida de fé, o preconceito contra vida; o arrojo é o começo do desrespeito, da covardia e a moderação é a identidade do amor maduro, equilibrado e responsável. A fé nos dá força para crescer e amadurecer, a coragem nos impulsiona para avanças e o amor nos capacita para amar criativamente sem medo.
Mas quem, afinal, representa esses três empregados? Assim, como Mateus também Lucas quer afirmar a mesma realidade: Jesus é mais aceito e esperado pelos pequenos e abandonados, injustiçados e oprimidos, excluídos e marginalizados, mas rejeitado pelos lideres religiosos e políticos do seu próprio povo. Os dois primeiros empregados representam todos aqueles que reconhecerem Jesus como messias e acolherem suas mensagens, enquanto que os líderes religiosos e políticos se fecham na fé ingênua e o desprezaram.
________&&&_______ BH., 16/11-2011
Lukas Betekeneng
[1] Lucius Annaeus Seneca é um filósofo no tempo imperial romano. Nasceu no ano 4 aC, em Córdoba , Espanha, e faleceu no ano 65 dC. Sua obra literária e filosófica, tida como modelo do pensador estóico durante o renascimento. Serviu também como inspiração para o desenvolvimento da dramaturgia europeia renascentista.
[2] Esse acréscimo também tem como pano de fundo os acontecimentos históricos que Lucas aproveitou para ilustrar seu relato: com o falecimento do Herodes Magno no ano 4 aC., um de seus filhos, o Arquelau, tinha ido a Roma para obter do Augusto, o imperador do então, a ratificação do testamento que lhe dava o governo da Judeia e o reconhecimento do título como rei.
segunda-feira, 14 de novembro de 2011
A IGREJA RUMANDO À META
(Lc 18,35-43)
A |
Igreja de Cristo nunca para, sempre em movimento, sempre em viagem, já está no caminho, mas ainda não chegou no seu destino, por isso continua no caminho em direção à Jerusalem celeste, como na palavra de Karl Rahner, a Igreja “já está na meta e rumo à meta”. Esse texto lucano do Evangelho nos mostra essa realidade de caminhada de Jesus rumo à sua meta, que é também a caminhada da própria Igreja. O caminho é feito para ser transitado, trilhado e não para ficar parado nele. Quem ficar parado no caminho atrapalha o trânsito e, consequentemente, dificulta todos os outros caminhantes que querem continuar marchando rumo à sua meta. Quem decidir de continuar caminhando já sabe (ou, pelo menos procurar saber) as consequências que tem que assumir com maturidade e equilíbrio, e ninguém pode nem tem direito de tentar impedi-lo de caminhar (cf. 13,32; Mt 16,23; ).
Esse caminho de Jesus rumo a Jerusalém, a cidade de Jericó é a penúltima etapa de sua viagem. E a cura do cego realizada nessa cidade é o último cumprimento de sua programação missionária como o enviado de Deus, desde a Galiléia à Judeia (cf. 4,18). Jesus tem consciência de sua missão: testemunhar a experiência do amor gratuito de Deus no amor pelo próximo, isto é, revelar ao mundo o rosto luminoso, amoroso, libertador, compassivo e misericordioso do Deus-amor. No cumprimento de sua missão, Jesus se comparou como fonte de água da vida que jorra sem parar para saciar toda a sede daqueles que o procuram (cf. Jo 4,13). Como água que corre do alto e que todas as vidas que estão no seu caminho recebem a vida em abundância (cf. Jo 10,10). Como água que não despreza nem discrimina e nem rejeita, mas acolhe com gratidão e respeito todas as raízes que a procuram (Jo 6,37), assim foi o modo de viver e agir de Jesus histórico e, assim também deveria ser o viver e agir da Igreja.
Há dois pontos importantes que o autor ressalta nesse pequeno texto: proclamação messiânica de Jesus como filho de Davi, feita pelo mendigo cego que está sentado na “beira do caminho” (representa as pessoas excluídas da sociedade) e a declaração de Jesus a respeito da fé do cego (vv. 38. 42). Além disso, o autor ressalta também a pedagogia de caridade do líder Jesus lucano: caridade a partir do sujeito. Jesus de Lucas não faz caridade assistencial e promocional, mas libertador. Trata a pessoa como sujeito ativo, conscientizando-o como alguém que é capaz de libertação e salvação. Por isso pergunta: “O que queres que eu faça por ti” (v. 41)? É esse tipo de caridade libertador que resulta no auto-reconhecimento e reconhecer o outro como diferente. Assim, o cego reconhece Jesus como o enviado de Deus e Jesus, por sua vez, reconhece a profundidade da fé do cego. Mais do que reconhecer a fé do cego, Jesus declara o sensus fidei (o sentido da fé do indivíduo ou, a intuição cheia de graça) do pobre cego que faz com que ele se integra no grupo de seguidores do Nazareno como ato de agradecimento e de louvor a Deus (v. 43).
Aqui está a sutileza da ironia do autor: quem reconhece Jesus como messias e acolhe suas mensagens são pessoas que não fazem parte da sociedade: os forasteiros, ribeirinhos e marginais. Os líderes religiosos e políticos – que deveriam mostrar o exemplo de cuidado – mandaram o cego calar a boca: “As pessoas que íam na frente mandavam que ele ficasse calado” (v. 39). Mas Jesus demonstra a atitude diferente, “parou e mandou que levassem o cego a ele” (v. 40). Que o espírito acolhedor e libertador do Ressuscitado reine na sua Igreja, nos corações de todos os cristãos. Ou seja, que os cristãos sejam um alter Christus para o mundo de hoje.
_______&&&_______ BH. 14/11-2011
Lukas Betekeneng
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